terça-feira, 29 de março de 2011

O Beijo da Minha Vida


Naquela noite, todas as energias convergiam para um mesmo fim... Cheguei lá, minutos após a meia-noite. A atmosfera estava vibrante, e eu, excitado.


Tanto vinho!... Acho que tomei o resto da garrafa no gargalo, caminhando do carro até a festa - o último gole, a alguns metros da entrada; sincronia perfeita.



Um alô para alguns vultos pouco reconhecíveis à minha volta; muita adrenalina, abraços e perfumes femininos. E lá de baixo, os ruídos da bagunça!


O acesso se dava descendo por uma escada metálica, em espiral. Muitas luzes e barulho; barulho do bom. Som e felicidade. Alguém se aproximou em companhia de outro alguém. As duas me olharam com largos sorrisos no rosto - a gente sabe quando tem alguém querendo jantar a gente. E eu nem mesmo havia descido do último degrau.



Quando desci, estava já escolhido e colhido, cercado, nos braços da mulherada... Mas, não! Recuei. Agradeci. Abandonei. Fugi! Busquei a planície. Queria me localizar, olhar à minha volta...



Então, enxerguei uma mulher e vi muitos movimentos pelo ar. Esguia e alta, em plena harmonia e sensualidade. Elas costumam ser desengonçadas quando passam de certa altura, mas não ela... Ela dançava solta, como se fosse dona da festa – e não era. E dançava como se fosse a mais linda da festa; isso ela era... Isso eu senti. Isso eu já sabia.



Atravessei o salão (como se faz naqueles filmes antigos em que a pista de dança ainda se chamava salão) e fui em sua direção, decididíssimo da vida. Parei diante dela e, aproximando minha boca de sua orelha, falei, suavemente:



- Posso me apresentar?...




Vi seus olhos brilharem ao mesmo tempo em que um sorriso sincero brotou em seus lábios. Dei à minha voz a gravidade adequada, emprestando-lhe um tom que a arrepiasse... Homens sabem fazer essas coisas.


Eu me sentia plenamente à vontade, e sabia que tinha diante de mim uma força incomum da Natureza – e com ela, eu podia ser também uma fortaleza. Não tive qualquer receio em abraçá-la, passando minhas mãos por sua cintura, encarando-a naturalmente, sorrindo com ela, cúmplices.



Então, uma música dos Beatles irrompeu pelas caixas de som...



- Eu adoro esta música!... -, disse um.

- Eu também!... -, disse o outro.


E veio o beijo...


Naquele momento, senti que éramos feitos do mesmo material cosmológico, onde emoção, lembrança, memória e sentimentos afloram sem conflito. Foi o beijo da minha vida.


photo by joão sassi

sexta-feira, 25 de março de 2011

Namorinho de Portão



Após a aula, sob o acachapante sol do meio-dia, três adolescentes - dois garotos e uma menina - conversam ao lado de um carro estacionado próximo à escola. Os dois, de pé, calados e de braços cruzados, de boné e aspecto ‘suburbano, estilo rapper’; ela, falante e meiga, sentada no capô, de camisetinha preta e bracinhos à mostra.



Enquanto explica alguma coisa aos meninos, ela deixa o delicado casaquinho branco que trazia à mão cair no chão... Passam-se intermináveis 10 segundos, até que ela mesma o resgate das marcas de borracha e poças de óleo no asfalto.



Para além de saudosa nostalgia quanto ao romantismo de outrora, ponho-me a conjecturar sobre o futuro...



Como se deixa um casaco branco de uma moça, caído ao chão, sem se esboçar qualquer reação?



Bruta geração.



photo by joão sassi